A sociedade brasileira atual é um rico produto de variados processos miscigenatórios que se iniciaram com a chegada do homem branco à América. Mesmo com a agressiva colonização e tentativa de uniformização cultural, as ricas culturas dos povos ameríndios se tornaram pilares primordiais para a construção do mundo em que vivemos hoje. Suas influências são inegáveis e se conservam através dos séculos, se projetando desde costumes cotidianos, aos campos da linguística, medicina, alimentação, artes entre outros.
Muitos são os exemplos dos encontros culturais que estruturaram nossa sociedade. Alguns são marcados por posturas etnocêntricas e padronizadoras, já outros se mostram como rico produto da mais pura essência cultural despertada pela miscigenação, como a cultura dos índios Kariboka do Brasil, habitantes da aldeia Tupãnaé localizada na região de Pariquera-Açu/SP.
Pajelança realizada entre as etnias Wassu Cocal e índios Kariboka, em Ouro Fino Paulista/ SP. |
Nos séculos da colonização muitos navios negreiros vindos da África aportaram na costa brasileira. Assim como os povos indígenas, os africanos também sofreram o choque agressivo provocado pelo encontro com o eurocentrismo, manchado por sua atividade exploratória e escravidão. Distante dos engenhos, muitos negros e índios escravizados buscavam seus refúgios nas selvas e florestas do território brasileiro, e promoviam um rico encontro de culturas marcado pela união étnica de povos oprimidos nas desventuras desgovernadas do homem branco. Esta união resultou em um rico patrimônio cultural e marca a essência dos índios Kariboka: a mistura entre o índio, o negro e o branco mestiço.
A progressão cultural que esta miscigenação proporcionou se constitui de aspectos que variam desde a alimentação e uso de recursos naturais, aos processos de curas medicinais e rituais de pajelança, uma rica fonte de conhecimentos espirituais e cosmológicos que se manifestam atualmente com sua mesma potência originária, regidos pelos mandamentos da natureza e mediados pelo Pajé Laguna, líder espiritual dos índios Kariboka. As pajelanças Kariboka acontecem tanto na comunidade da aldeia Tupãnaé como também em um ponto de encontro localizado em Ribeirão Pires, na Associação União Espírita Irmã Gezebel, que promove encontros interculturais além de ações sociais focadas na fé umbandista.
Estivemos em um desses encontros, onde reuniram-se os índios Kariboka e índios da etnia Wassu-Cocal (AL) para realização do ritual de pajelança. O resultado foi uma rica e transformadora experiência evidenciada pelo contato com estas culturas. Como revela o relato de Rodolfo Ochoa.
“Visitamos uma associação onde aconteceu um ritual chamado Pajelança,, realizado pelas tribos Wassu-Cocal e Kariboka nas localidades de Ouro Fino Paulista, Ribeirão Pires. A eventualidade foi marcada por diversos acontecimentos, entre eles danças, rituais, pequenas palestras e até um batizado religioso. Ao decorrer do ritual, estes acontecimentos nos cativavam gradativamente, pelo fato de serem diferente e desconhecidos de nossas percepções. Em meio as rodas das danças e rituais fomos pegos de surpresa: uma nativa da tribo wassu-cocal que fazia parte do ritual, puxou exatamente eu, o Caique e Cauê ao centro da roda, e disse que sentiu energias que se assemelham aos "laços da morte” e pediu que “vigiássemos” as pessoas que se aproximam de nós, ao mesmo tempo em que indicava que tais laços estavam por serem rompidos naquele momento do ritual em que estávamos envolvidos. Naquele momento paralisamos, um choque de realidade, colocando nossos pés no chão, nitidamente nos abalando.
O sentimento emanado de nossas mentes possuem uma complexidade que talvez dificulte o trabalho de tentar expressar de alguma forma aquilo que foi despertado. Contudo, aqueles garotos que entraram no evento saíram novos homens, fruto ou não de nossas imaginações, essa pancada existencial nos metamorfoseou para o bem.”
A cultura dos índios Kariboka, bem como todas as culturas das etnias indígenas do território americano, são uma abundante fonte de ensinamentos introspectivos e ao mesmo tempo sintonizados ao cosmos, e condicionam o homem como integrante dos mandamentos da Natureza, devendo preservá-la e elevar-se espiritualmente às energias que regem as mutações do universo através de rituais, e assim estabelece uma vida harmoniosa e sintonizada pelas mediações de nossa intima naturalidade.
Conhecer as culturas indígenas é fundamental àqueles que se aventuram a trilhar novos caminhos e buscar sempre sua evolução espiritual, elevando sua vida material a um processo de intenso e essencial aprendizado.
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Texto: Cauê Colodro
Maravilhoso gostaria de saber quando se uniram todos na comunidade
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