18 de setembro de 2016

Multiculturalidade Indígena: inundando o córrego do Etnocentrismo.


Não é necessário irmos tão longe para percebermos a gigantesca diversidade cultural de nossa sociedade. Mesmo com as hipóteses do monogenismo de nossa espécie, o homem foi capaz de desenvolver inúmeros modos de comportamento, costumes, e maneiras de interpretar o mundo em que atua, variando de acordo com a síntese de fatores que vão desde condições ambientais ao estágio mais profundo da consciência. Durante toda história, diversos conflitos culturais marcaram os registros da humanidade, prevalecendo muitas vezes a intolerância e a incapacidade de interpretar as incertezas do universo sem torná-las definitivas. Este caráter etnocêntrico criou um cenário favorável ao surgimento de estereótipos e anulação de culturas antigas e fundamentais para reconhecimento de nossas origens, como a rica cultura dos povos indígenas daAmérica.


Exposição Adornos do Brasil Indígena: Resistências Contemporâneas.


As evidências antropológicas indicam que a progressão evolutiva da espécie humana aconteceu nas regiões africanas, gerando assim muitos questionamentos a respeito da povoação do homem em outros territórios do globo. Neste contexto, muitas teorias sobre a chegada do homem ao continente americano surgiram e se mostram indefinidas até os dias atuais. A mais aceita é a hipótese de que o homem migrou para a América atravessando o estreito de Bering durante as eras glaciais, quando o nível do mar diminuiu e possibilitou a passagem de animais terrestres. O estreito se localiza no mar de Bering, que delimita a menor proximidade entre as terras americanas e o continente europeu, situado entre a América do Norte e a Rússia. Apesar das incertezas destas condições migratórias, o fato é que, neste novo território, a espécie humana mostrou novamente sua autonomia em desenvolver ricos patrimônios culturais.

Porém, enquanto os Incas, Astecas, Maias e outros povos antigos da américa central/sul aprimoravam seus avanços culturais, entre concepções matemáticas e cosmológicas, desenvolvimento da agricultura e uma religião fundamentada na natureza e seus recursos, a Europa ocidental passava por um nebuloso período marcado pela intolerância religiosa, social e etnocêntrica da Idade Média. O etnocentrismo da época, regido pelo fervor da religião católica, ganhou grande dimensão e implicou confrontos ideológicos determinantes para a história, como a reforma protestante de Lutero no século XVI. Neste cenário conturbado de conflitos culturais das sociedades europeias, as propriedades sociolinguísticas e designativas da linguagem deram origem a um novo termo para definir este caráter fundamentalista europeu: o eurocentrismo. E este conceito difundiu-se por muitos territórios do planeta graças ao pensamento expansionista das grandes navegações, e objetivava a sobreposição das culturas europeias como referência mundial à sociedade moderna. Os impactos do eurocentrismo em outras culturas é facilmente percebido ao analisarmos as condições atuais das antigas colônias, considerando o caráter explorador e agressivo da chegada de europeus em terras desconhecidas a esta limitada interpretação dos diferentes padrões culturais. A cada nova “descoberta” territorial europeia a história parece se repetir, a busca constante pela anulação cultural dos novos povos contatados, escravização e a exploração de recursos naturais são algumas das características que marcaram a expansão do eurocentrismo. Em território sul-americano, rico em diferentes aspectos e gerador de uma abundante diversidade cultural proveniente dos povos indígenas, não foi diferente com a chegada dos europeus. 


Exposição Adornos do Brasil Indígena: Resistências Contemporâneas.
 
Segundo o PIB (PovosIndígenas do Brasil), na época da chegada dos portugueses onde hoje é o território brasileiro, estima-se que havia mais 1.000 povos habitando a região, somando entre 2 e 4 milhões de pessoas. Nos dias atuais, estão listados 247 povos e 150 línguas diferentes (alguns povos ainda vivem em isolamento). A interpretação equivocada das culturas indígenas como unidade singular se mostra insuficiente diante da complexidade cultural deste patrimônio. Sua pluralidade se desdobra como um grande rio constituído de diferentes afluentes, que compõem um complexo sistema hídrico onde cada unidade se afirma em sua essência cultural originária, e se projeta nos terrenos da mitologia, cosmologia, astronomia, artes, poesia, rituais, linguística, habitação, e fascinam os que se dedicam a nadar e mergulhar fundo nessas águas. Diante da imensa variedade dos modos de vida das culturas indígenas, a tentativa europeia de afunilar este rio multicultural e direcioná-lo ao córrego do eurocentrismo, trava uma dura e sangrenta batalha que já dura 516 anos, e vem sendo omitida desde então pelas instituições, formais ou informais, detentoras do poder da informação.  

Entretanto, na atualidade, os povos indígenas vêm utilizando cada vez mais uma moderna e poderosa ferramenta em sua defesa: a cibercultura. As propriedades democráticas de consumo e produção de conteúdo desta nova cultura digital estabelecida pela chegada da internet, lançam um novo olhar sobre os aspectos multiculturais das comunidades indígenas, e rompem com o ocultamento das suas lutas sociais e ambientais, além de expor para o conhecimento da sociedade a importância e relevância das culturas ameríndias. Se analisarmos com atenção, são inúmeras as influências destas culturas em nossa sociedade atual, desde nomes e expressões até costumes cotidianos, alimentares e sociais. Entretanto, a apropriação miscigenaria do homem branco sobre estes aspectos desconsidera tais referências culturais, evidenciando uma forte herança do eurocentrismo e cria uma imagem do índio selvagem e primitivo incapaz de responder por questões de sua própria vida e ambiente em que vive. Sem autonomia, acaba anulado da sociedade moderna e tratado exclusivamente como objeto de preservação.

A realidade dos povos indígenas atuais está bem distante desta concepção. Os parâmetros da cibercultura deram voz ativa ao índio, e ela ecoa pelo ciberespaço quebrando paradigmas e preconceitos do senso comum, desatando os nós deixados pela colonização e conscientizando a sociedade a respeito do rico patrimônio cultural do território em que vivemos.

Acompanhe nossas postagens e mergulhe também nestas águas multiculturais e vença a reprodução estereotipada de opiniões sobre as ricas raízes da cultura brasileira.

Confira - Sites Indígenas 

Fotos: Zas Comunicação e Arte. 
Texto: Cauê Colodro.

  

0 comentários :

Postar um comentário